Os Mestres da Suspeita NIETZSCHE
Como resultado do trabalho
intelectual dos “Mestres da Suspeita”, a filosofia e as ciências humanas enveredaram
por trilhas incontornáveis e irreversíveis na tentativa de superar as aporias denunciadas
por Marx, Nietzsche e Freud. No coração do universo de problemas que eles abriram
se encontra o debate sobre o fundamento e as promessas do Iluminismo. Examinada
por eles, a síntese operada no século XVIII, sobretudo na Alemanha, de um
projeto de universalização do pensamento racional visando à adoção da ciência
como única modalidade legítima de conhecimento se revelou como o momento mais
alto de um processo iniciado na época dos pré-socráticos, na Grécia Antiga. Para
a compreensão do significado e das consequências desse processo para a humanidade,
eles demonstraram a necessidade de empreendermos a crítica de seus pressupostos
e a avaliação de suas promessas. Nesse ponto, o exame separado de suas obras
pode nos proporcionar experiências modificadoras de nossa própria compreensão
do presente, do modo como concebemos o papel que a filosofia exerce na implantação,
na propagação e na revisão o projeto iluminista, sobretudo no que tange à
formação da juventude em vista de seu agenciamento para a transformação ou a consolidação
do curso da história.
Ao iniciarmos o nosso trabalho pela leitura do
Prólogo e da Primeira Dissertação de A
Genealogia da Moral, esperamos despertar nos estudantes a sensibilidade necessária
para perceberem a gravidade dos problemas denunciados por Nietzsche. Para o
referido pensador, não pode haver maior escândalo para o homem contemporâneo do
que se dar conta de nada conhecer de si mesmo, posto que nosso maior orgulho
consiste em afirmarmo-nos como sujeitos de conhecimento, como menestréis da
ciência. Tais excertos também são relevantes por nos darem acesso à maneira como
Nietzsche concebe o exercício da filosofia e a sua forma de considerar a
filosofia como o modo de vida. Por se tratar de um texto de maturidade, A Genealogia da Moral pode ser
considerado como um livro representativo do cerne do pensamento nietzschiano,
onde a variedade de questões problematizadas por seu autor comparece de maneira
coerente e vivaz de maneira a permitir ao leitor a exploração do que existe de
mais significativo no legado do filósofo.
Segundo
Oswaldo Giacóia Jr., podemos aceitar, para fins de exposição didática, a
divisão da produção filosófica de Nietzsche, em três momentos: no período de
1870 a 1876, estão situadas as obras de juventude, marcadas sobretudo pelas
influências de Schopenhauer e Wagner bem como pelo projeto de levar às últimas
consequências a tese de que na renovação do espírito da música se encontraria o
antídoto para combater o amesquinhamento da cultura promovido pelo socratismo. De
1876 a 1882, suas obras testemunham a ruptura com seus antigos mestres e a
inflexão pela qual Nietzsche se aprofundou na investigação dos fundamentos da
moral, reformulou seus pressupostos concernentes às relações entre a arte e o pensamento
racional e aperfeiçoou suas ferramentas de investigação. O último período da
produção intelectual de Nietzsche compreende os anos de 1882 a 1889, quando seu
trabalho foi abruptamente interrompido pelo colapso de sua saúde mental. As
obras desse período são aquelas nas quais emergiram as concepções mais
fulgurantes de sua filosofia, como a do “último homem” e a do “além do homem”,
em contraposição às denúncias da “Morte de Deus” e da morte da metafísica pronunciadas
nos livros das fases precedentes.
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