OS MESTRES DA SUSPEITA


Estudar os clássicos da filosofia contemporânea é uma tarefa complicada. Numerosos e variados são os pensadores que deixaram sua marca no cenário cultural dos séculos XIX e XX ao passo que o século XXI já está marcado por renomados expositores das inquietações da pós-modernidade. Sem pretender adotar uma solução fácil para cumprir o encargo de organizar um plano de estudos para uma disciplina de História da Filosofia Contemporânea para estudantes de Licenciatura em Filosofia, decidi propor leituras de textos que são reconhecidos pela comunidade acadêmica como representativos do pensamento contemporâneo e que comportam problematizações radicais dos fundamentos da civilização ocidental.
Como também fui encarregado de desenvolver atividades de formação pedagógica de caráter teórico e prático voltadas para a organização de planos de ensino, projetos de pesquisa e atividades de extensão em torno das questões fundamentais da filosofia contemporânea, adotei, nos dois casos, textos de Marx, Nietzsche e Freud como pontos de partida para a exploração das possibilidades acadêmicas e pedagógicas desses domínios dos estudos de filosofia e da formação do professor de filosofia. Na organização desses estudos, coloquei Nietzsche em primeiro lugar. Esse privilégio se deve ao fato de que, embora a recepção de sua obra tenha ganhado força após a publicação dos livros de Marx, me parece que as pretensões filosóficas do autor de Para Além do Bem e do Mal são mais ambiciosas do que as dos autores do Manifesto Comunista. Ademais, acrescento que a obra de Freud, na qual o pensamento de Marx muito se apoia, possui estreitas relações com o pensamento de Nietzsche e é a partir deste que a Psicanálise ataca os problemas do mal-estar da civilização.
Para os fins aos quais nos propomos, antes de considerar as divergências, gostaria de destacar, em linhas gerais, o que há de comum entre esses pensadores. Ora, o diagnóstico de seu tempo é, sem dúvida, a preocupação que animou as investigações de cada um deles e os esforços pelos quais se deu o amadurecimento de suas teses, as retificações e inflexões que se podem constatar ao longo das trajetórias desses “Mestres da Suspeita”. Suas inquietações foram despertadas, igualmente, pelos eventos históricos que fizeram dos séculos XIX e XX, simultaneamente, a época mais violenta e a mais avançada tecnologicamente da história da humanidade. O que explica o privilégio que eles concederam à ciência como objeto de suas reflexões, nas quais, entretanto, não se descuram de problematizar a arte, a religião, o direito, a política, a ética e outras dimensões da cultura.
Destacam-se, também, as pretensões de empreender a crítica dos valores fundamentais da cultura ocidental. Para realizar tal objetivo, cada um de nossos autores se destacou como fundador de novas tradições no domínio da leitura dos clássicos do pensamento humano. Por isso, falamos de uma hermenêutica histórica desenvolvida no rasto da obra de Nietzsche, do materialismo histórico e dialético como método de pesquisa das relações sociais e da psicanálise como método de interpretação da cultura.



Comentários

  1. A organização de forma dinâmica dos textos traz uma finalidade didático à interpretação dos desafios dos séculos XIX e XX. Por isso, a interação aos textos de Nietzsche, Marx e Freud traz uma reflexão em entorno dos desafios filosóficos. Portanto que os mestres das suspeitas possam contribuir com suas reflexões perante o século XXI.

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    1. Prezado Moisés,
      Obrigado por seu comentário.
      Desejo que possamos avançar nesses estudos para que sejam desenvolvidas diversas estratégias visando fomentar a leitura desses autores nas escolas do Ensino Médio.
      Abraço,
      Nelson Noronha

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  2. Os clássicos são vistos como leituras densas e que exercem um esforço e dedicação "dobrada". Geralmente, nós graduandos não tivemos acesso na educação básica o que se torna uma dificuldade quando nos deparamos em primeiro momento no ensino superior. O background (pano de fundo) conta muito, e a colaboração do mestre para o educando. Este dinamismo na relação com outros autores contribuem para uma reflexão mais aprofundada.

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    1. Oi, Vanessa.
      Você tem toda a razão. O que nos faz lembrar que, no Ensino Médio, embora a Filosofia não se destina a promover a erudição como ideal de educação, a adoção da leitura de clássicos da Filosofia tem se mostrado um recurso muito interessante, que favorece o despertar do interesse dos estudantes pelo exercício da reflexão filosófica. Mas esse recurso precisa ser desenvolvido mediante o planejamento e a sensibilidade dos professores no que tange à situação de vida dos jovens para os quais dirige o seu ensino.
      Não é um tarefa fácil, mas certamente bastante desafiadora.
      Bom Trabalho!
      Nelson

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