Autonomia do Pensamento e Atualidade da Filosofia
Autonomia
do Pensamento e Atualidade da Filosofia
Nelson Matos de
Noronha
O interesse de Michel Foucault pela obra de Kant se torna
explícito em seu artigo O Que São as
Luzes? O foco dessas análises foi a relação das inquietações de Kant com o
presente e o conjunto do projeto das Críticas.
Elas atravessaram as volutas dos escritos do autor da Crítica da Razão Pura, pelo menos desde a Dissertação de 1770 até a publicação da última versão da Antropologia de um Ponto de Vista Pragmático,
em 1798 (v. PASCAL, 2001). Duzentos anos separam a publicação do artigo de
Kant, na Berlinische Monatsschrift, e
a conferência recolhida por Paul Rabinow em seu Foucault Reader (v. FOUCAULT, 2000 [a], p. 335).
Historiador das ideias, Foucault apreendeu no artigo de
Kant o vínculo indissociável dos esforços do filósofo alemão para responder às
três questões das quais a filosofia não pode se livrar e pelas quais se
organizam os seus campos de investigação: 1ª.
O Que posso saber? 2ª. O que devo
fazer? 3ª. O que me é permitido
esperar? Tal liame, segundo Kant, somente poderá ser explicitado quando a
humanidade for capaz de responder a uma quarta questão: - O Que é o Homem? (FOUCAULT, 2000 [a], pp. 340-341). Face a esse
desafio, a trajetória intelectual de Kant se apresenta para nós, seus leitores
inconformados, como um esforço fracassado para assentar as bases de uma
sociedade formada por indivíduos moralmente autônomos, situados
intelectualmente à altura dos avanços da ciência, da ética, da política e da
arte de seu próprio tempo.
Não é o caso agora de justificar a afirmação de que o
projeto kantiano da Crítica fracassou.
Um estudo das objeções de Marx ao idealismo alemão talvez possa fornecer as explicações
mais adequadas para esse debate. Certamente, as investigações de Nietzsche
sobre a genealogia dos valores morais afetaram muito dolorosamente as
exigências do imperativo categórico. A anedota de Freud sobre o nascimento da
Psicanálise[1]
constitui, sem dúvida, a última pá de cal na cova do idealismo transcendental.
Porém, os mesmos coveiros de Kant não tardaram a mostrar
que
Os homens fazem a sua própria
história; contudo, não a fazem de livre e espontânea vontade, pois não são eles
quem escolhem as circunstâncias sob as quais ela é feita, mas estas lhes foram
transmitidas assim como se encontram. A tradição de todas as gerações passadas
é como um pesadelo que comprime o cérebro dos vivos. (MARX, 1981, p. 25).
e que:
“Grava-se algo a fogo, para que
fique na memória: apenas o que não cessa de causar dor fica na memória” — eis
um axioma da mais antiga (e infelizmente mais duradoura) psicologia da terra.
Pode-se mesmo dizer que em toda parte onde, na vida de um homem e de um povo,
existem ainda solenidade, gravidade, segredo, cores sombrias, persiste algo do
terror com que outrora se prometia, se empenhava a palavra, se jurava: é o
passado, o mais distante, duro, profundo passado, que nos alcança e que reflui
dentro de nós, quando nos tornamos “sérios”. (NIETZSCHE, 1987, pp. 61-62).
Freud
igualmente apontou o peso do passado sobre a consciência moderna:
Quando já se viveu por muito tempo
numa civilização específica e com
frequência se tentou descobrir quais foram suas origens e ao longo de que
caminho ela se desenvolveu, fica-se às vezes tentado a voltar o olhar para
outra direção e indagar qual o destino que a espera e quais as transformações
que está fadada a experimentar. Logo, porém, se descobre que, desde o início, o
valor de uma indagação desse tipo é diminuído por diversos fatores, sobretudo
pelo fato de apenas poucas pessoas poderem abranger a atividade humana em toda
a sua amplitude. A maioria das pessoas foi obrigada a restringir-se a somente
um ou a alguns de seus campos. Entretanto, quanto menos um homem conhece a
respeito do passado e do presente, mais inseguro terá de mostrar-se seu juízo
sobre o futuro. (FREUD, S., 1927-31), p. 4).
As inquietações do filósofo
de Konigsberg se apresentaram como uma investigação sobre as condições de
possibilidade formais da verdade, da virtude e do juízo do belo articulada à
hipótese e à esperança de uma Ideia de
uma história universal de um ponto de vista cosmopolita. Articulação que
ainda reverbera entre nós na polêmica entre a dialética e o estruturalismo. Os
trechos citados dão testemunha dessa presença pela qual a aspiração à autonomia
do pensamento constitui o problema central dos escritos dos “Filósofos da
Suspeita” (Marx, Nietzsche, Freud), ainda que estes a ela se reportem mediante
um indicador da sua negação (alienação, dor, ignorância). Ao demonstrar como se
faz o uso legítimo da razão, a Crítica
se apresenta para os homens como o “livro de bordo da razão”, ao passo que a Aufklärung (Esclarecimento) é a “era da
Crítica”. (FOUCAULT, 2000 [a], pp.
340-341).
A partir desta constatação,
Foucault mostra como o pequeno texto de 1783 estava atrelado às investigações
de Kant sobre a Filosofia da História e o grande projeto da Crítica. A faculdade da crítica é aquela
pela qual os homens alcançam a capacidade de fazer uso de seu próprio
entendimento sem a direção de outrem. E tal capacidade requer condições
políticas e sociais específicas para se desenvolver ao longo dos eventos produzidos
pelos homens no curso de suas relações intersubjetivas, isto é, na história.
As leituras paralelas dos textos
de Foucault e Kant ensejam a reflexão sobre o impasse crônico enfrentado pelos
Departamentos de Filosofia das Universidades Brasileiras. Desde 1962, por
ocasião da aprovação do Parecer no. 277/62, do Conselho Federal de Educação, (citado
por MUCHAIL, 1996, p. 66), a organização dos currículos dos cursos de formação
de professores de filosofia se pauta pela divisão entre um bloco “histórico” e
um bloco “sistemático” pela qual se tenta superar a “rigidez” e a
“uniformidade” dos cursos seriados anteriores. Para substituir tais aspectos,
buscou-se a “flexibilidade” e a “diversificação” como princípios favorecedores
de “um projeto dentro do qual possam mover-se livremente as diversas correntes
do pensamento filosófico” (SUCUPIRA, N. apud MUCHAIL, S., 1996, p. 68).
Não vamos aqui tachar as
atividades filosóficas desenvolvidas nas universidades brasileiras falando em
“Escolas”. Porém, podemos estabelecer com certeza que a formação de professores
de filosofia nessas instituições se beneficiou do uso recorrente de dois tipos
de abordagem de textos filosóficos. O primeiro é O Método em História da Filosofia, de Martial Guéroult (1974), no
qual aprendemos a decompor os clássicos da filosofia para recompor o sentido de
sua totalidade mediante a reconstituição da ordem de suas razões. O outro texto
é Por toda parte e em parte alguma,
de Maurice Merleau-Ponty (Capítulo V de Signos),
no qual o autor faz uma série de reflexões sobre as relações da Filosofia com o
seu exterior, com a sua própria história e com o seu presente para verificar
até que ponto os sistemas são capazes de ultrapassar uma mera opinião.
Acredito que o depoimento comum
de Marcos Nobre e Ricardo Terra (2007) é suficiente para legitimar o que acabo
de dizer. Para os eminentes professores, a introdução oficial dos estudos de
filosofia no Brasil ocorreu por ocasião da criação do Departamento de Filosofia
da Universidade de São Paulo, quando o diletantismo foi substituído pelo
esforço de profissionalização do ofício de Professor de Filosofia. Um forte
sinalizador da pertinência dessa hipótese são as Diretrizes Curriculares Nacionais dos Cursos de Filosofia aprovadas
em 2001 pelo Conselho Nacional de Educação. No referido documento, todos os
cursos de filosofia no país deverão organizar suas atividades de modo a
proporcionar ao licenciado ou ao bacharel:
Sólida formação de história da filosofia, que
capacite para a compreensão e a transmissão dos principais temas, problemas,
sistemas filosóficos, assim como para a análise e reflexão crítica da realidade
social em que se insere (BRASIL, 2001).
Assim como seu antecedente de 1962,
o Parecer CNE/CS 492/2001 concebe como objetivos dos cursos de graduação em
filosofia a formação de profissionais aptos a atuarem tanto na docência quanto
na pesquisa e eventualmente em áreas de assessoria cultural. Essa qualificação
deverá ser alcançada mediante três eixos norteadores pelos quais se definem as
competências e habilidades a serem desenvolvidas mediante os componentes
curriculares do curso: a) o Eixo Crítico-reflexivo; b) o Eixo
Analítico-hermenêutico; c) o Eixo Interdisciplinar. Nesses eixos podemos
identificar aquele vínculo entre o sistema e a história já anotado por Foucault
no desdobramento das investigações de Kant, o qual também podemos observar nas
preocupações de Marcos Nobre e Ricardo Terra a propósito da rigorosa formação
dos professores de filosofia. O privilégio concedido à leitura de textos
filosóficos e à produção de monografias como atividades imprescindíveis para o
desenvolvimento daquelas habilidades é patente nas DCN, nos Parâmetros
Curriculares Nacionais do Ensino Médio e nos Projetos Político-Pedagógicos dos
Cursos de Filosofia na maioria das Universidades brasileiras.
Esse encontro do “sistema” e da
“história” é um dos elementos caracterizadores da atividade filosófica na
modernidade. Desde o final do século XVIII, cujo pensamento é ilustrado pela
obra de Kant, a “finitude” se tornou uma categoria central do saber. (FOUCAULT,
2000 [b], p. 463). Portanto, quando tentamos aceder ao que é especificamente
filosófico no circuito das produções discursivas é inevitável que atravessemos
aqueles eixos preconizados pelas DCN dos cursos de Filosofia. Assim se explica
a longevidade de tais diretrizes. Se a verdade de um livro de filosofia não
pode ser extraída sem a reconstituição de sua ordem de razões, o sentido de uma
filosofia não pode ser alcançado sem que se mergulhe na trajetória pela qual se
constituiu uma vida filosófica.
Não se trata, então, de um
impasse nem de uma coincidência. Evitamos apresentar uma fórmula para dar a
conhecer a especificidade da atividade filosófica, uma vez que isso implicaria
desprezar a diversidade de concepções que se apresentam na história como
sistemas, como trajetórias, como discursos ou como experiências. Preferimos
confessar que nos situamos em uma perspectiva a partir da qual elaboramos nosso
modo de compreensão da atividade filosófica e a exercemos. A partir dessa
posição, podemos propor a questão do ensino da filosofia como problema
filosófico.
Ora, essa questão não poderia ser
proposta sem que, seguindo as escolhas programáticas dos cursos de filosofia,
seja afastada a ideia de um programa de estudos no qual se dê preferência à
acumulação de conteúdos em detrimento do domínio das técnicas de análise,
interpretação, crítica e de redação de textos filosóficos. Esse caminho tem
sido reconhecido como uma opção bem-sucedida para a superação do diletantismo e
o desenvolvimento de trabalhos rigorosamente elaborados e com alto grau de
excelência acadêmica (MUCHAIL, 1996; NOBRE & TERRA, 2007). Diante dessa
constatação, podemos dar como certa a especificidade filosófica do trabalho
pedagógico desenvolvido nos cursos de formação de profissionais de filosofia
nas universidades brasileiras.
No entanto, outros aspectos
preconizados pelos pareceres do antigo CFE e do atual CNE têm sido apontados
como problemáticos. A longa e difícil luta para tornar obrigatório o ensino da
filosofia no ensino secundário e no ensino médio é um dado suficiente para nos
convencermos disso (NOBRE & TERRA, 2007). O Conselheiro Newton Sucupira, em
1962, já sinalizara o ponto fulcral que até hoje explica a instabilidade
institucional do ensino de filosofia na educação básica. Ele se preocupava em
assegurar a “isenção” na organização dos cursos de filosofia para evitar que se
vincule o currículo a uma ortodoxia ou a uma corrente doutrinária. A
organização didático-pedagógica deveria colocar o ensino de filosofia acima dos
prejuízos e das ideologias (citado por MUCHAIL, 1995, p. 72).
Colocado sob um outro
revestimento, o problema, no entanto, é o mesmo. Já demos como assentado que a
formação do profissional de filosofia requer conhecimentos teóricos e
metodológicos cuja aquisição implica o exercício da pesquisa. Mas somente
fizemos referência aos textos filosóficos como matéria para a realização dessa
atividade. A especialização e o aprofundamento são habilidades indispensáveis à
capacitação do docente de filosofia para o ensino médio bem como para o
profissional que optar por perseguir uma carreira acadêmica no ensino superior
ou em instituições de pesquisa. As DCN de filosofia adotam uma visão segundo a
qual, para que a formação desses profissionais seja considerada completa, ela
deve contemplar a capacidade de estabelecer relações entre a compreensão
sistemática dos textos filosóficos, a análise da história da filosofia e os
problemas da atualidade, nos campos da ciência, da arte, da política, da
cultura, etc. Daí a necessária referência ao desenvolvimento de competências
para o estudo e a pesquisa interdisciplinares. Sem elas, voltamos ao dogma da
neutralidade.
Ora, nesse ponto, identificamos outro
aspecto da questão do ensino de filosofia como problema filosófico. A
especificidade da hermenêutica dos textos de filosofia enseja ao ensino de
filosofia uma senda pela qual se reconhecem as implicações filosóficas desse ofício,
uma vez que aí o acesso aos livros de filosofia não é meramente informativo e
sim um mergulho em uma dimensão existencial demarcada pela estrutura teórica e
conceitual do discurso. Nessa dimensão, a linguagem constitui o solo no qual se
travam múltiplas relações onde se articulam o saber, os sujeitos, os valores,
os objetos segundo regras ou epistemologias que ordenam a abrangência, a
sistematicidade, o devir e a unidade do plano existencial problematizado pelo
texto (FOUCAULT, 2007; SEVERINO, 2010).
Mas, da leitura de textos de
filosofia, se espera que o licenciado e o bacharel de filosofia passem à
leitura filosófica do mundo. Na verdade, como bem disse Paulo Freire, “a
leitura do mundo precede sempre a leitura da palavra e a leitura desta implica
a continuidade da leitura daquele” (FERIRE, 1989, p. 13). Voltamos, assim, à
análise foucaultiana do artigo de Kant sobre o “Esclarecimento”. Um laço nos
une ao projeto kantiano da Crítica,
uma vez que nele se encontra uma parte indelével da herança que recebemos do Iluminismo.
Trata-se do juízo que fazemos de nosso ser histórico quando a ele atribuímos o
epíteto da “Modernidade” e até mesmo o da “Pós-Modernidade”. De uma maneira ou de outra, nos posicionamos face
ao presente como um ponto na história que se diferencia do passado por um
acontecimento incomum. Kant via na Revolução Francesa o sinal da ruptura da
modernidade com o Antigo Regime e a prova de que existe na humanidade uma
disposição incontida para se libertar de toda tutela nos campos do conhecimento
da verdade, da conduta moral, no da religião e no da experiência estética (KANT,
1986). Sua atividade filosófica pode ser vista, assim, como uma tentativa de
compreender aquela ruptura e, ao mesmo tempo, de impulsionar essa disposição
para o Esclarecimento. Olhando para trás, podemos dizer que esta seria a
maneira kantiana de ser moderno.
Se somos herdeiros de Kant e do
Iluminismo, qual seria nossa maneira de ser “modernos”? Ou será que somos
“pós-modernos”? E o que isto quer dizer? O debate filosófico que se travou ao
longo dos séculos XIX e XX e que até agora produz diversos desdobramentos é o
veio que nos fornece os elementos para retomar a inquietação que, desde Kant, anima
nossa Modernidade e supostamente constatar o esgotamento das expectativas do
Iluminismo. Com Marx, Nietzsche e Freud identificamos as dimensões fundamentais
da existência humana (o trabalho, a vida, a linguagem [FOUCAULT, 2000 [b]). São
elas que fornecem a matéria da reflexão filosófica que se alterna na crítica
aos limites das condições de acesso da consciência às relações materiais de
produção, da capacidade humana de controlar os fenômenos de morbidez, da insuperável
polissemia das formas e dos meios de comunicação e na permanente retomada dos
esforços para nos liberar do excesso de tempo dedicado ao trabalho, para
prolongar indefinidamente a longevidade e para fundar uma língua absolutamente
transparente ao ser. Se esse diagnóstico apresentado por Foucault em As Palavras e as Coisas Uma Arqueologia das
Ciências Humanas for correto, o legado que recebemos de Kant merece ser
tratado não somente como objeto de uma rigorosa análise de suas razões, mas,
sobretudo, como um modelo que nos provoca a criar a nossa maneira específica de
questionar filosoficamente a relação que temos com o presente e, assim, a inventar
a nossa própria maneira de ser modernos. Se daí chegarmos à conclusão de que experimentamos
ou vivenciamos acontecimentos que produziram rupturas com o universo cultural e
político inaugurado pela Revolução Francesa e o Iluminismo, então, talvez,
poderemos dizer que já somos pós-modernos.
Ora, a atitude filosófica de Kant,
tal como podemos aprendê-la no artigo acima citado, consiste em problematizar
as condições requeridas para que a humanidade siga o curso de sua disposição
natural para sair do estado de menoridade. Sem dúvida, podemos identificar
nesse artigo uma marca universal da atitude filosófica: o diálogo com a
tradição da história da filosofia. Não nos iludamos com a ideia de que aí se
trata da continuação de um esforço milenar na direção do aperfeiçoamento da
cultura (esta é a hipótese de Kant). Trata-se de responder a uma inquietação da
sociedade que estava em formação e que, como dizia Kant:
Duas coisas enchem o ânimo de
admiração e veneração sempre novas e crescentes, quanto mais frequentemente e
com maior assiduidade delas se ocupa a reflexão: o céu estrelado sobre mim e a ordem moral dentro de mim. (KANT, CRPr
A290, S/D, p. 182).
Isto é, se trata do diálogo do
filósofo com os discursos da ciência e da filosofia no qual se mobilizaram os
recursos da tradição filosófica para a reorganização do entendimento do mundo,
que se viu desagregado pelas alterações sofridas na velha ordem da ciência, da
ética e do juízo estético.
O artigo escrito por Foucault e
publicado na coletânea organizada por Paul Rabinow nos fornece um exemplo paradigmático
do esforço de leitura de textos filosóficos no qual se articulam de maneira
intensa e provocativa as competências e habilidades preconizada pelas DCN de
filosofia. Da estrutura arquitetônica-conceitual do artigo sobre a Aufklärung, Foucault extrai uma síntese
da ordem de razões das três Críticas
sem deixar de interpretar o sentido fundamental do problema da autonomia do
pensamento tal como este é postulado no pequeno texto. Nos três domínios das Críticas, assim como na explicação sobre
a saída do homem de sua menoridade, o que se põe em jogo é uma determinada
relação entre a vontade, a autoridade e o uso da razão (FOUCAULT, 2000 [a], p.
337). Assim, pois, sua análise nos fornece um rico subsídio para que possamos
formar uma ideia adequada a propósito do significado daquelas prescrições do
CNE:
Capacitação para um modo especificamente filosófico
de formular e propor soluções a problemas, nos diversos campos do conhecimento;
- Capacidade de desenvolver uma consciência crítica
sobre conhecimento, razão e realidade sócio-histórico-política;
- Capacidade para análise, interpretação e
comentário de textos teóricos, segundo os mais rigorosos procedimentos de
técnica hermenêutica;
- Compreensão da importância das questões acerca do
sentido e da significação da própria existência e das produções culturais;
- Percepção da integração necessária entre a
filosofia e a produção científica, artística, bem como com o agir pessoal e
político;
- Capacidade de relacionar o exercício da crítica
filosófica com a promoção integral da cidadania e com o respeito à pessoa,
dentro da tradição de defesa dos direitos humanos. (BRASIL/MEC, 2001).
Esse trabalho, todavia, não se
limita a reconstituir um edifício teórico para que possamos contemplá-lo como a
um monumento (GUÉROULT, 1974) e extrair de sua perfeição e de seu rigor os princípios
para alcançarmos o conhecimento da verdade, os preceitos morais e as
determinações subjetivas para forjar a retidão do caráter. O próprio texto de
Kant fornece a Foucault as bases para a passagem dos eixos crítico-reflexivo e analítico-hermenêutico
ao eixo interdisciplinar. Observe-se que, ao se reportar à trajetória de Kant,
não faz menção a aspectos da vida pessoal, mas sim, às circunstâncias políticas
e sociais, ao ambiente intelectual e aos discursos que habitam, por assim,
dizer, os escritos desse autor. Portanto, o sentido do texto perseguido pelo
historiador das ideias não constitui uma atividade de interlocução com o
indivíduo Immanuel Kant, que nasceu em 22 de abril de 1724, na cidade de Konigsberg,
e faleceu nessa mesma cidade em 12 de fevereiro de 1804. Esse é um caminho
legítimo que muitos tem adotado como atitude filosófica, mas não é o caso de
Foucault. Como ele justifica sua escolha?
Assumindo sua ligação
intelectual a Kant e ao Iluminismo, Foucault explica que ela se dá justamente
por uma atualização da filosofia como atividade enraizada no presente e acionada
pelos eventos que, tendo sido determinados pelo passado, promovem em nossas maneiras
de pensar, julgar e agir modificações inapagáveis. Ou seja, a fidelidade do
pensador contemporâneo em relação a Kant e ao Iluminismo não pode, para ele,
consistir no apego às doutrinas e aos princípio, mas sim, à disposição do
pensamento crítico para a compreensão do presente e para o emprego dessa
atividade na modificação daqueles aspectos do mundo no qual vivemos que se
mostrarem intoleráveis no que concerne às relações entre a vontade, a
autoridade e ao uso da razão.
Ora, para levar adiante esse
propósito, Foucault entende que os estados subjetivos, as preferências
políticas, morais e estéticas dos indivíduos, suas “representações” não contém
os elementos que permitem ao investigador atingir o “objeto” de sua pesquisa.
Tais elementos se encontram na materialidade dos “arquivos”, os discursos
efetivamente enunciados (v. FOUCAULT, 2000 [a]. pp. 92-93). O procedimento metodológico
que se debruça sobre tais elemento foi denominado de “arqueologia”, o qual
consiste na descrição dos discursos e não em sua intepretação nem em sua
decomposição lógica. Essa descrição, como se pode ver em seu estudo sobre Kant,
não se reporta somente aos elementos formais do texto e nem se lança em uma
especulação sobre as intenções secretas e subliminares do autor. De fato,
empreende-se a análise dos elementos do discurso e de suas relações epistemológicas
para daí compreendê-las em seu funcionamento. Todos esses elementos se
encontram no texto: sua arquitetura teórica, o elenco de conceitos e categorias,
os princípios de articulação lógica e de causalidade bem como o sujeito dos
enunciados e os seus objeto, considerados como funções internas aos discursos e
como tais, se distinguem do autor (sujeito que enuncia ou escreve o discurso) e
das coisas, ainda que entre uns e outros possamos identificar relações de signo
e significado, significação e sentido. O que talvez seja inusitado é a tese de
que, além disso, os elementos “externos” ao discurso também o habitam, como as
situações políticas, econômicas e sociais que ensejam deslocamentos
conceituais, emergência de novos objetos, alteração dos crivos da sensibilidade,
reestruturação das funções sociais e políticas das instituições, substituição
dos regimes de validação dos enunciados científicos, etc.
A resposta de Kant à pergunta “Que é
o “Esclarecimento”? (“Aufklärung”) se
torna, assim, o local para uma exploração “arqueológica”, cujo resultado pode
ser apresentado como uma coleção de peças datadas: o jornal de Berlim, como
testemunha da emergência de uma nova dimensão da vida social caracterizada pela
imprensa, a liberdade de expressão, a censura, a opinião pública, as
manifestações qualificadas dos intelectuais, a divulgação das notícias da
França e da Revolução Francesa, dos livros de Hume e de Rousseau, etc; o autor,
renomado Professor da Universidade de Konigsberg, sócio das Academias de
Ciências de Berlim, de São Petersburgo e de Viena; autor de uma obra
revolucionária de Filosofia; um Clássico incontornável da História da Filosofia
associado indelevelmente ao movimento das Luzes do Século XVIII. Um grande
número de outras peças ainda pode ser catalogado, se pensarmos na evolução das
ciências, nas reformas das Universidades Europeias, nos eventos políticos que
promoveram uma ampla e profunda reorganização das nações e dos estados no velho
e no novo continente, na aceleração da expansão do capitalismo industrial e
financeiro, etc.
Essa pletora de elementos, contudo,
não enseja, na descrição arqueológica dos discursos, a decisão de lançar mão de
artifícios que favoreçam à formação das unidades teóricas que nos são
familiares, como os gêneros literários, as disciplinas científicas, as
“épocas”, as “eras”, os “séculos”, etc. Como se pode perceber, Foucault destaca
uma diferença muito interessante que se apresenta no artigo sobre as Luzes em
relação a outros textos nos quais Kant se dedica a pensar filosoficamente sobre
a história. Essa diferença consiste em substituir suas antigas inquietações
sobre o que distingue uma época de outra, os sinais que anunciam o limiar de um
novo tempo ou a “aurora de um novo tempo” pela interrogação sobre “a diferença
que ele (o presente) introduz em relação ao ontem” (FOUCAULT, 2000 [a], p.
336-337). Considerado como acontecimento, o Esclarecimento (Aufklarung) é uma “saída”, uma
“solução”. O texto analisado por Foucault é tomado como testemunha de um
trabalho em curso, uma intervenção em um debate público, um momento crucial na
elaboração de uma “obra” da qual, ainda que a pessoa cujo nome hoje lemos
impresso no frontispício de alguns livros consagrados da história da filosofia fosse
consciente de sua própria ambição intelectual, no momento em que enviara aquele
artigo ao mensário berlinense, o problema que animava sua reflexão ainda não
havia se consolidado como “verdade consagrada”, estava vivo como atividade do
pensamento e como tal não se erguia ainda sobre um sistema nem sobre o nome de seu
autor.
Ora, nessa condição inusitada,
o texto sobre o qual Foucault se debruça também enseja a ilustração daquele
procedimento ao qual chamou de “genealogia”, empregado para designar as
pesquisas por ele realizadas a partir de 1975 (MUCHAIL, 2004, p. 15). Além da
descrição dos elementos eminentemente discursivos, a “genealogia” é o
procedimento pelo qual o historiador das ideias problematiza as relações entre as
práticas discursivas, as práticas extradiscursivas e as instituições. Agora, se
avançarmos sobre as análises de Foucault sobre em que consiste o “Esclarecimento”,
perguntando, como ele mesmo o fez, se nós mesmos somos modernos ou
esclarecidos, veremos que, para responder a essa questão, ele compara as
diferenças entre sua própria atitude intelectual e a de Kant para discernir
como cada um empenhou sua atividade filosófica na elaboração de uma resposta
que, simultaneamente, dissesse quais eram ou seriam as alterações históricas
que estavam em curso e como eles e seus contemporâneos poderiam contribuir para
acelerar, aprofundar, ampliar ou refrear tais mudanças.
Kant se empenhava não em ensinar
aos seus contemporâneos uma lição sobre a história da filosofia, mas em advertir-lhes
sobre uma obrigação que precisavam cumprir se pretendessem contribuir para o
avanço da humanidade no seu esforço incansável para escapar a todas as formas
de tutela intelectual, política ou moral. Seu ensinamento comportava a
demonstração racional da existência de processos naturais, sociais e políticos que
regem a existência humana e que a conduzem inelutavelmente para a realização de
suas disposições biológicas e espirituais – a saída o homem de sua menoridade -.
Essa advertência se justifica porque, em seu entendimento, “Esclarecimento [Aufklärung] é a saída do homem de sua
menoridade da qual ele próprio é o culpado.” (KANT, 1985, p. 100). Neste
sentido, aí se pode identificar, ao mesmo tempo, um processo universal que
abrange toda a humanidade em suas disposições naturais e um dever moral e
político que obriga cada indivíduo e a totalidade do gênero humano a se
empenharem na busca desse objetivo. Os desdobramentos desse postulado consistem
na investigação das condições políticas e sociais que tornam possível o
cumprimento desse dever. Tais condições hoje, segundo Kant, são os obstáculos
mais difíceis de serem superados, pois, no que concerne à sua condição natural,
os homens já foram liberados dos grilhões bem mais severos.
A
preguiça e a covardia são as causas pelas quais uma tão grande parte dos
homens, depois que a natureza de há muito os libertou de uma direção estranha (naturaliter maiorennes) , continuem no
entanto de bom grado menores durante toda a vida. (KANT, 1985, p. 100).
A primeira e única condição
social e política para que a humanidade avance a caminho de seu próprio
esclarecimento é a LIBERDADE, sobretudo a Liberdade de Expressão, segundo Kant.
Assim, a razão filosófica se dirige aos governantes, os quais, como todos os homens,
estão implicados no dever de promover a saída do homem de sua menoridade. Duas
objeções se fazem ouvir: da parte dos governantes, a de que a falta de limites
para liberdade é uma situação desfavorável ao seu exercício. O que justifica a
determinação do soberano: “Obedecei!”. Da parte dos súditos: é mais cômodo
permanecer sob a tutela de alguma autoridade, pois é, ao mesmo tempo tão cômodo
entregar seus negócios à direção de outrem e tão perigoso pensar, julgar e agir
por sua própria conta. Mas, segundo Kant, é quase inevitável que um público se
esclareça pois sempre haverá nele alguns indivíduos capazes de fazê-lo. Estes
disseminarão, necessariamente, o germe da discórdia, espalhando preconceitos e
insuflando a revolta, mesmo que, posteriormente, esses mesmos provocadores se
tornem novos tutores do povo. A revolução, portanto, para Kant, não é a saída que
a humanidade precisa buscar para alcançar o Esclarecimento, isto é, para empenhar-se
em se libertar de seus tutores.
Esse caminho possui dois momentos:
o primeiro consiste em demonstrar que é viável a criação de uma situação
política, espiritual e institucional na qual sejam possíveis o uso da razão para
fins de assegurar o cumprimento dos fins do Estado e o uso da razão para
promover o Esclarecimento. No primeiro caso, uso privado da razão ocorreria
quando uma autoridade se dirigisse aos seus subalternos para lhes enviar
comandos, advertir-lhes sobre suas obrigações militares, civis, comerciais,
morais, religiosas, etc. No segundo caso, o uso universal, público e livre da
razão se faria, na condição de Cidadão Cosmopolita, para se dirigir à toda a
humanidade, de maneira desinteressada, comunicando-lhe o resultado de sua
atividade de pensar por pensar.
O segundo momento desse percurso
consiste na promoção de um acordo entre “o despotismo racional com a livre
razão” (FOUCAULT, 2000 [a], p. 341) para assegurar o uso público da razão. A
partir daí, no lugar tão somente de obedecer, os súditos estariam sujeitos ao
seguinte preceito: “raciocinai tanto quanto quiserdes e sobre qualquer coisa
que quiserdes: apenas obedecei” (KANT, 1985, p. 114). Em contrapartida, o
soberano que promover em seu Estado tal legislação poderá se sentir ao mesmo
tempo satisfeito, por favorecer a disposição natural da humanidade para buscar
a sua dignidade, e seguro, uma vez que seus súditos saberão reconhecer tanto a
necessidade de limitação das liberdades civis como condição necessária para
empreenderem a conquista de suas aspirações quanto a impossibilidade de
transgredir tais limites da razão e da liberdade, uma vez que tal legislação
foi redigida de acordo com princípios desenvolvidos pelo uso público da razão,
isto é, com o consentimento dos súditos. O que torna menos perigosa a ameaça
sempre iminente de uma revolução insuflada pela disseminação de preconceitos.
Para Foucault, a exposição de Kant
sobre o Esclarecimento fornece a diferença pela qual hoje nos separamos da
atitude filosófica que ele tomou diante das questões de seu próprio tempo no
que tange às relações da consciência face à vontade, à autoridade e ao uso
público da razão. Trata-se de estabelecer os limites do uso da razão, a linha
divisória entre a liberdade e a sujeição.
A diferença do artigo sobre o
Esclarecimento em relação aos demais escritos de Kant sobre a história, segundo
Foucault, consiste em que esse artigo não apenas interroga os seus
contemporâneos sobre a sua própria compreensão do presente, mas, além disso, a
partir dessa compreensão, se dá conta de que os acontecimentos requerem uma
tomada de posição e o engajamento em uma tarefa que se impõe como uma obrigação
de cada um em relação ao conjunto da humanidade e em relação a si mesmo. Ou
seja, se trata de propor uma interrogação sobre a tarefa que nossa compreensão
do presente exige que seja cumprida pelos indivíduos isoladamente e pela
coletividade, de maneira solidária.
Assim se explicam as reservas de
Foucault ao que ele chamada de “humanismo”. Ao se referir a esse termo de
maneira genérica, Foucault elege um amplo conjunto de interlocutores reunindo uma
grande parte daqueles que analisaram, interpretaram, aplicaram ou contestaram o
pensamento kantiano. Não resta dúvida, no entanto, de que Marx, Nietzsche e
Freud, entre tais interlocutores, são privilegiados pelo autor de História da Loucura na Idade Clássica. Esses pensadores retomaram o debate de Kant com
a modernidade e cada um deles examinou essa questão sob uma perspectiva
diferente, abrangendo aquelas dimensões nas quais se apresentam as relações
entre a vontade, a autoridade e o uso da razão. No texto de Kant, essas
relações são postas a propósito de uma categoria universal: o homem ou a
humanidade. Os “filósofos da suspeita” mostraram o caráter genérico e
metafísico dessa categoria e a necessidade de redimensioná-la para examinar os
aspectos que a tornam palpável: sua concreticidade, sua historicidade, sua diversidade.
A despeito dessa “retificação”, nem o marxismo, nem os nietzschianos nem a
psicanálise lograram até agora varrer da esteira dos discursos filosóficos o
caráter idealista e metafísico projetado nas reflexões sobre o nosso presente e
sobre as tarefas que sua compreensão exige de nosso tempo. Ainda somos
humanistas, como bem confessou Sartre (SARTRE, 1984).
Para Foucault, o humanismo é uma
categoria muito frágil e instável para poder ser tomada como base teórica para
o deslindamento da questão que se apresenta ao presente no domínio das relações
entre a vontade, a autoridade e o uso da razão. Além disso, a maneira complexa
e diversificada com que se apresentam tais relações em nossos dias requer que
examinemos mais rigorosamente do que Kant o fez as condições institucionais sob
as quais as autoridades exercem sobre nós, atualmente, a sua tutela. Kant se
reportava ao guia que encontramos no livro (portanto, ao seu autor), ao guia
espiritual e ao médico como autoridades preferenciais da maioria das pessoas quando
estas se veem impelidas a se colocarem sob a proteção de um tutor. Em nossos
dias, tais personagens foram substituídos pelos meios de comunicação de massa,
pelas instituições de controle social (família, escola, igrejas, escritórios e
fábricas, o exército) e pelos sistemas de saúde pública e seguridade social. Os
conceitos de liberdade, uso privado e o uso público da razão não podem ser
examinados hoje com os mesmos parâmetros aplicados por Kant para a proposição
de um novo acordo que assegure as condições necessárias ao Esclarecimento da
Humanidade. Isso porque, por outro lado,
a relação dos indivíduos com as autoridades não se limita a terem simplesmente
de obedecer ou de dar o seu consentimento para legitimar o poder que se exerce
sobre eles. Na verdade, os objetos dessas relações não são apenas os indivíduos.
Com estes se encontram simultaneamente as coisas (os territórios, os recursos
da natureza e os produtos do trabalho humano) e as populações. Nesses domínios,
outras categorias se mostram mais abrangentes do que a de Humanidade: a Vida, O
Trabalho, a Linguagem. Tais relações são mediadas pelos regimes de verdade que
regem nossos discursos, pelos modos de organização da produção e da circulação
que regem nossas relações de troca e pelas normas que regem nossos sistemas de
comunicação. Tal complexidade torna defasada a categoria de “humanidade” assim
como todas as figuras de que ela se revestiu para afirmar, esclarecer,
prescrever, ensinar, advertir, protestar ou apelar quando se tratou de postular
a defesa do progresso, a libertação e a autonomia dos indivíduos e da
sociedade.
Nesse quadro, não podemos falar
das obrigações que o nosso tempo nos impõe nesses domínios de maneira tão
simplória como “Sapere aude! (Ousa
Pensar!) tem coragem de fazer uso do teu próprio entendimento,...” (KANT, 1985,
p. 100). Falando assim, atribuímos aos
indivíduos isoladamente a culpa de a humanidade permanecer em estado de
menoridade. Se aprendemos alguma coisa com Marx, Nietzsche e Freud é o fato de
que não temos bases consistentes para assumir uma atitude de arrogância perante
a natureza, perante os outros e nem perante a nossa própria consciência
individual. Somos todos uns governados, diria Foucault.
O que acabamos dizer nos remete,
finalmente, ao centro de nossas discussões sobre a autonomia do pensamento e o
ensino de filosofia na atualidade. Ao se reportar à trajetória intelectual de
Kant, Foucault põe em discussão o percurso que ele mesmo trilhou para considerar
a possibilidade e a pertinência de avaliá-lo como constituidor de uma vida
filosófica. O seu ponto de partida é a afirmação de seu laço de pertinência ao
legado ou à tradição inaugurada por Kant e consagrada pelos eventos que
constituíram o “Aufklärung”. Do
trabalho de Kant, os escritos de Foucault repercutem aquela nova maneira de conceber
a tarefa da filosofia: não como um corpo dogmático de doutrinas, mas como uma
atividade incansável pela qual o pensamento se põe a cumprir a tarefa que o seu
próprio presente lhe impõe: tornar-se autônomo. Dos críticos de Kant, que, como
tais, podem ser considerados, eles mesmos, kantianos, o trabalho de Foucault
reteve a exigência de submeter todas as categorias antropológicas ao crivo da
história, naquelas dimensões que tais representações são problematizadas pelas
ciências humanas e a filosofia: a vida, o trabalho e a linguagem.
Esse percurso, embora tenhamos
de reconhecer a singularidade de cada autor, não constituiu uma exceção entre
os que se dedicaram, no século XX, a retomar a discussão sobre a modernidade
nos termos explicitados por Kant. Encontramos na mesma trilha Adorno, Benjamin,
Habermas, Hanna Arendt e muitos outros identificados ao pensamento crítico. Ora,
evidentemente, não podemos exigir do professor do ensino médio que se compare a
essas pessoas que são verdadeiros monumentos da História da Filosofia. Pois
bem! A leitura de Foucault sobre um “texto menor” de Kant e sobre a trilha que
ele mesmo percorreu constitui uma reflexão sobre o estatuto e o papel do
intelectual em nossos dias. O que exige de Foucault uma atitude de
distanciamento e de crítica em relação a Kant e à Aufklärung não é a falsidade de suas ideias, mas as condições
concretas de nossa própria atualidade. O professor não possui mais a vantagem
que o intelectual do século XIX detinha como porta-voz da humanidade. E isso também
se pode dizer de muitos outros ofícios nos quais o saber acadêmico está
envolvido, como os escritores, os físicos, os biólogos, os médicos, os juristas
e os teólogos. Assim, não estamos mais autorizados a ENSINAR, a prescrever aos
outros o que eles podem conhecer, o que devem fazer e o que podem esperar do
futuro. O próprio Kant já nos alertava para a incompatibilidade dessa atitude
face ao desafio de vencer a sujeição de nosso espírito à autoridade de um
tutor. Tudo o que podemos fazer é criar as condições para que os estudantes
aprendam a pensar[2].
Mas essa tarefa não pode ser atribuída tão somente ao professor de filosofia. Ela
constitui um encargo da sociedade e do conjunto dos atores que promovem a vida
da escola.
O estatuto social e institucional
dos docentes na atualidade foi fidedignamente descrito por Theodor Adorno em um
artigo tão curto como aquele de Kant (ADORNO, 1995). Ao analisar os Tabus que pairam sobre a profissão de
ensinar, o eminente representante da Escola de Frankfurt descreve diversas
situações pelas quais podemos constatar a degradação social, profissional e
pessoal dos professores devido ao papel social e à representação que o
imaginário da sociedade cultiva desses personagens na dinâmica social do
capitalismo. A despeito desse amesquinhamento dos docentes e das instituições
de educação, Adorno demonstra alguma esperança de que o Professor e a escola
detenham a capacidade de contribuir para a desbarbarização da humanidade. Em
outro artigo, ele vai direto ao ponto: “Qualquer debate sobre ideias da
educação é vão e indiferente em comparação com este; que Auschwitz não se repita. Aquilo foi a barbárie, à qual toda a
educação se opõe” (ADORNO, 1995, p. 104). A situação local e específica do
Professor é suficiente, não para que ele abrace a missão do Arauto da
Humanidade, mas para nos mostrar que a compreensão dos impasses do mundo atual
e das exigências políticas e morais que eles fazem à consciência de cada
indivíduo e a da sociedade não nasce nos grandes sistemas filosóficos, mas sim,
das situações específicas nas quais o intelectual exerce o seu ofício como
funcionário público e como trabalhador.
Compreendemos, assim, as medidas
de precaução adotadas por Foucault em suas atividades filosóficas: sua recusa a
empreender a elaboração de um “sistema”, a fundar uma “teoria”, a erguer uma
“obra de filosofia”. Atitude que não expressa uma falsa modéstia, mas sim, a
honestidade de um projeto que se reconhece como provisório, sujeito a
retificações e a críticas sem deixar de postular o seu caráter homogêneo, geral,
sistemático e propositivo. Ao fazer o balanço das pesquisas que empreendeu,
Foucault assinala que sua fidelidade a Kant e à Aufklärung consiste em reformular o modo kantiano de conceber a
relação que uma atividade filosófica pode entabular com o seu próprio presente.
Se o projeto kantiano da Crítica deveria
se haver com os princípios transcendentais do conhecimento da verdade, da ação
moral e da conduta ética, o trabalho da arqueo-genealogia se obriga a lidar com
nossas relações atuais com as coisas, com os outros e as do sujeito a si mesmo,
não em termos de limitação das capacidades da razão, mas em termos de aumento
dessas capacidades e, também, de ampliação dos limites atuais da liberdade.
Já demonstramos há alguns
parágrafos atrás que o ensino de filosofia constitui por si mesmo um problema
filosófico, considerando tão somente a sua tarefa de proporcionar aos
estudantes a habilidade e a competência para a leitura e a intepretação de
textos de filosofia. Em seguida, mediante o exame das considerações de Foucault
ao artigo de Kant sobre o Esclarecimento (Aufklärung),
exploramos as implicações do estudo da história da filosofia face aos desafios
que o nosso presente lança a todos os que aspiram a se tornarem emancipados.
Nisso também reconhecemos a especificidade filosófica do ensino de filosofia,
que aí não aparece somente como uma tarefa técnica, mas como uma obrigação
epistemológica, política e ética. Nos resta tentar encurtar a distância destas digressões
pautadas na leitura em relação ao trabalho efetivo do professor e de seus
alunos na produção da reflexão filosófica em sala de aula.
Passaremos, assim, ao exame do
que dizem o artigo das implicações do artigo 2º. Da lei 9.394/2006, que
estabelece as Diretrizes e Bases da educação Nacional e, o artigo 5º. da Resolução
no. 2, de 1º. de julho de 2015, do Conselho Pleno do Conselho Nacional de
Educação, que define as Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação inicial em
nível superior (cursos de licenciatura, cursos de formação pedagógica para graduados
e cursos de segunda licenciatura) e para a formação continuada.
Segundo a determinação da LDB,
Art. 2º A educação,
dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos
ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do
educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o
trabalho. (BRASIL, 1996).
O ensino de filosofia nas escolas
do Ensino Médio no Brasil parece se justificar como parte de um esforço para
assegurar que a educação formal promova o “pleno desenvolvimento do educando,
seu preparo para o pleno exercício da cidadania e sua qualificação para o
trabalho”. Ora, o empenho dedicado a demonstrar a contribuição da filosofia
para alcançar esse objetivo tem enfrentado obstáculos muito difíceis de serem
vencidos. As leituras dos textos de Kant e de Foucault nos fornecem muitos
subsídios para compreendermos as causas dessas dificuldades. Ainda assim, graças
a uma demanda persistente da sociedade, nossa disciplina tem permanecido nos
currículos escolares até agora. O que se explica pelo entendimento de que o
saber que se obtém nessa atividade, que não se detém sobre um objeto próprio e
específico, favorece a aquisição de competências intelectuais e morais que
seriam muito mais improváveis de serem assimiladas pelos estudantes caso não se
lhes tivesse sido apresentado. Um saber que se define como inútil por não se
organizar em torno do conhecimento de um objeto próprio, por não se permitir
fazer prescrições morais, éticas, religiosas nem estéticas, mas que tem provado
sua utilidade ao colocar os estudantes em situações de confronto com o regime
de verdade que nos rege, o modo de produção econômica que faz a gestão de nossos
desejos e aspirações, e os dispositivos de controle de nossas relações com os
outros e as do sujeito com si mesmo.
Ora, essa vantagem nem sempre é
vista com bons olhos pelas autoridades responsáveis pelas políticas de educação
no Brasil. E isso repercute nas condições de trabalho dos professores. A crítica,
o rigor, a integridade intelectual que se aprende no estudo da filosofia pode deixar
o professor em situações de constrangimento e de vulnerabilidade. Para
sinalizar a pertinência do que digo, basta apelar para que se examine bem as
implicações da recente reforma da legislação sobre o ensino médio para o
trabalho de professor de filosofia nas escolas públicas e privadas. Tais
dificuldades podem desestimular mais ainda os profissionais que têm levado a
cabo a tarefa que a filosofia se impõe de prover os estudantes de recursos teóricos
e metodológicos para a leitura e a redação de textos filosóficos.
Gostaria de voltar a Kant e a
Foucault para fazer novas digressões sobre esta questão. Imagino a sala de aula
como um espaço que pode ser utilizado de diferentes maneiras, de acordo com a
atitude filosófica ou pedagógica do professor. Kant anunciava o programa de
seus cursos anuais com antecedência para que os estudantes se preparassem para
segui-los. Ele se recusava a organizar o seu ensinamento como um programa de
“conteúdos” para, em troca, propor um trabalho de pesquisa e reflexão:
O
método peculiar de ensino de filosofia é zetético
(ζητειν), isto é, investigante, e só se torna dogmático, isto é, decidido, no caso de uma razão mais exercitada em diferentes
questões. Também o autor filosófico em que nos baseamos no ensino deve ser
considerado não como um modelo do juízo, mas apenas como o ensejo de julgarmos
nós próprios sobre ele e contra ele; e o método de refletir e concluir por conta própria é aquilo cujo domínio o
aprendiz está a rigor buscando, o qual é o único que lhe pode ser útil, de tal
sorte que os discernimentos decididos que porventura se tenham obtido ao mesmo
tempo têm que ser considerados como consequências dele, consequências estas
para cuja plena abundância ele só tem de plantar em si mesmo a raiz fecunda.
(KANT, 1992, p. 175).
Foucault, por sua vez, tendo sido professor
universitário, antes de se tornar uma estrela da mídia, disse, respondendo, na
condição do anonimato, a uma entrevista a um famoso jornal francês:
Eu
dizia há pouco que a filosofia era uma maneira de refletir sobre nossa relação
com a verdade. É preciso acrescentar; ela é uma maneira de nos perguntarmos: se
esta é a relação que temos com a verdade, como devemos nos conduzir? Acredito que se fez e que se faz atualmente
um trabalho considerável e múltiplo, que modifica simultaneamente nossa relação
com a verdade e nossa maneira de nos conduzirmos. E isso em uma conjunção
complexa entre toda uma série de pesquisas e todo um conjunto de movimentos
sociais. É a própria vida da filosofia. (FOUCAULT, 2000 [a], p. 306).
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In: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9394.htm
BRASIL/MEC;
Parecer CNE/CES 492/2001(Despacho do Ministro em 4/7/2001, publicado no Diário
Oficial da União de 9/7/2001, Seção 1e, p. 50.) In: http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/CES0492.pdf.
BRASIL/MEC;
Resolução no. 2, de 1º. de julho de 2015, do Conselho Pleno do Conselho
Nacional de Educação; define as Diretrizes Curriculares Nacionais para a
formação inicial em nível superior (cursos de licenciatura, cursos de formação
pedagógica para graduados e cursos de segunda licenciatura) e para a formação continuada.
http://portal.mec.gov.br/docman/agosto-2017-pdf/70431-res-cne-cp-002-03072015-pdf/file
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1980 – o Filósofo Mascarado; in: Michel Foucault Arqueologia das Ciências e
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[1]
No transcorrer dos séculos, o ingênuo
amor-próprio dos homens teve de submeter-se a dois grandes golpes desferidos
pela ciência. O primeiro foi quando souberam que a nossa Terra não era o centro
do universo, mas o diminuto fragmento de um sistema cósmico de uma vastidão que
mal se pode imaginar. Isto estabelece conexão, em nossas mentes, com o nome de
Copérnico, embora algo semelhante já tivesse sido afirmado pela ciência de
Alexandria. O segundo golpe foi dado quando a investigação biológica destruiu o
lugar supostamente privilegiado do homem na criação, e provou sua descendência
do reino animal e sua inextirpável natureza animal. Esta nova avaliação foi
realizada em nossos dias, por Darwin, Wallace e seus predecessores, embora não
sem a mais violenta oposição contemporânea. Mas a megalomania humana terá
sofrido seu terceiro golpe, o mais violento, a partir da pesquisa psicológica
da época atual, que procura provar o ego que ele não é senhor nem mesmo em sua
própria casa, devendo, porém, contentar-se com escassas informações acerca do
que acontece inconscientemente em sua mente. (FREUD, S., 1917, p. 30).
[2] Em suma ele (o
professor) não deverá ensinar pensamentos,
mas a pensar; não se deve carregá-lo, mas guiá-lo, se se quer que ele (o estudante) seja apto no futuro a caminhar por si próprio (KANT, 1992, p.
174).
Nesse texto "Autonomia do Pensamento e Atualidade da Filosofia," do profª
ResponderExcluirNelson Matos de Noronha, se torna muito importante as reflexões citadas ao campo filosofico aos dias atuais. Por isso muito proveitoso é a leitura do texto pois problémas filosoficos e o curso de filosofia nas universidades do brasil entra na discussão de forma clara apontando o momento que vivemos com algumas heranças históricas de filosofia e a instigação para desenvolvermos a autonomia do pensamento, assim como o grande no Hall de citações de autores classicos da história de filosofia compondo os dialogos no texto. Obrigado pela publicação professor !!!